quarta-feira, 2 de março de 2011

ASHTANGA YOGA


Historicamente, não se sabe exatamente o ano que Patañjali viveu, mas foi aproximadamente entre 500 e 200 A.C., e ele costumava escrever sobre medicina, gramática e Yoga. Os Yoga Sutras, ou linhas sobre o Yoga, foram compilados por Patañjali em 196 aforismos, que tratam de todos os aspectos da vida, como um código de conduta que nos leva ao autoconhecimento. Lá, são descritos os meios de superar as aflições do corpo e flutuações da mente, que são os obstáculos para o desenvolvimento espiritual.

O livro é dividido em quatro padas, ou capítulos:
1- Samadhi pada (sobre a contemplação)
2- Sadhana pada (sobre a prática)
3- Vibhuti pada (sobre os poderes)
4- Kaivalya pada (sobre a libertação)

No capítulo I, aforismo 2, está a definição de Yoga: “yogah cittavritti nirodhah”, que significa: Yoga é o controle das flutuações da mente, isto é, manter a mente num estado inabalável em situações diversas, como dificuldades, conquistas, tristeza ou felicidade. Após definir o Yoga, Patañjali explica como atingi-lo, através de alguns métodos.

O Ashtanga Yoga, que são as oito partes que constituem a prática do Yoga, é revelado no capítulo II, aforismo 29:
- Yama (abstenção)
- Niyama (observância)
- Asana (postura)
- Pranayama (controle da respiração)
- Pratyahara (controle dos sentidos)
- Dharana (concentração)
- Dhyana (meditação)
- Samadhi (superconsciência)

Nos Sutras seguintes cada membro do Yoga é explicado detalhadamente. Todos são interligados, isso quer dizer que a prática de um membro sustenta o outro.

- Yama pode significar abstenção ou autocontrole, tem relação com nossas atitudes exteriores do dia-a-dia, isto é, a forma com que nos relacionamos com todos os seres e as atitudes que temos perante o mundo. São os valores universais, aplicados em qualquer lugar. São divididos em cinco:

  1. Ahimsa: não violência, em palavras, pensamentos e ações; não causar dano a ninguém. Quando tal atitude ocorre, não há espaço para hostilidade. Ahimsa deve ser uma atitude verdadeira e natural, e isso ocorre com a mudança de conduta do praticante, respeitando todos os seres humanos, animais e vegetais, inclusive a si próprio, em todas e quaisquer circunstâncias, e eliminando o ódio e negatividade de suas ações, bem como de seus pensamentos.
  2. Satya: verdade; ser sincero e honesto; pensamentos e palavras em conformidade com as ações. Sri Ramakrishna costumava dizer que a verdadeira espiritualidade consiste em “fazer do coração e lábios o mesmo”. A prática de satya e ahimsa estão sempre ligadas. Contudo, dizer a verdade de um fato a alguém pode ser cruel, pode machucar. Então, é importante usar o bom-senso e tomar cuidado com o que é dito. Em algumas ocasiões, é preferível manter o silêncio a dizer uma verdade severa.
  3. Asteya: não roubar, nem em ações ou em pensamentos. Não se apropriar do que não lhe pertence significa falta de desejo, de cobiça, pelas posses de outrem.
  4. Brahmacharya: continência, ou viver com Deus. Alguns interpretam como celibato. A energia sexual é uma das maiores expressões da força vital, é bastante poderosa, assim, é necessário o seu controle e canalização. Algumas pessoas, dedicadas ao ensino espiritual, optam pelo celibato como um canal de retenção da energia vital. Para outros, não significa uma renúncia a atividade sexual, e sim uma boa conduta com relação ao parceiro, usando a energia sexual de uma forma positiva, sem banalização. Há ainda o entendimento de que brahmacharya significa união com Deus, viver no caminho divino em todos os momentos.
  5. Aparigraha: falta de ganância; desapego; não cobiça com relação a posses, bem materiais e também situações, como querer muito uma postura difícil, ir além do próprio limite, conquistar algo ou alguém, etc. Aparigraha nos ensina sobre a impermanência, em que sempre queremos mais quando algo é conseguido. Dizem que o ser humano “é eternamente insatisfeito”, tal frase pode ser entendida em uma palavra: cobiça. Quando se consegue viver na ausência de cobiça, entende-se a realidade da existência através da retirada do sentimento de “meu”, “seu”, que chamamos de posse. Dessa forma, a pessoa se livra da sensação de escassez, ou falta de algo.

- Niyama são observâncias individuais, disciplinas que cada pessoa faz consigo mesma. São elas:

1.    Saucha: purificação externa e interna (ex.: banho, prática de asana e pranayama). O corpo é o instrumento de busca do conhecimento espiritual. Com a limpeza do corpo e da mente, podemos purificar nossos pensamentos, o que nos leva a não julgarmos e agirmos com mais clareza, objetividade e compaixão.
2.    Santosha: contentamento. Através do contentamento alcança-se a suprema felicidade. Santosha não trata da felicidade passageira, não significa satisfação de um desejo imediato, pois este sempre leva ao próximo, então o momento feliz sempre acaba terminando em sofrimento. Santosha mostra que a felicidade só depende de nós, não de coisas externas. Quando vemos a felicidade em todos os momentos, mesmo difíceis, estamos praticando Santosha.
3.    Tapas: autodisciplina do corpo e órgãos dos sentidos; devoção. A disciplina, através do esforço, é um caminho para o autoconhecimento. Com tapas, as impurezas do corpo e sentidos são removidas, e estes se tornam purificados. A determinação é importante ao se praticar tapas. Aqui, não significa que o praticante, ao executar uma postura, deve ir além do seu limite para fazer cada vez melhor, pois assim pode se machucar durante a prática e se frustrar. Nada em excesso é bom. Tapas é esforçar-se com prudência e dedicação, sem focar nos resultados da ação.
4.    Svadyaya: estudo de si; estudo das escrituras. A prática regular de Yoga é o auto-estudo do praticante. A prática diária é o caminho para o conhecimento dos hábitos, tendências, gostos, da verdadeira natureza do ser.
5.    Ishvara pranidhana: entrega a Deus. Com a entrega do resultado das ações ao Divino, alcança-se o Samadhi, a realização. Se a prática de Yoga é feita com devoção, existe entrega, e assim não há obrigação, e sim uma força interior muito grande, sem pensar em qualquer resultado ou desejo em atingir algo maior.

- Asana é uma postura firme e confortável. Esta é a definição de Patañjali no Sutra II, 46 (“sthira sukham asanam”). Para se obter a firmeza no asana, o praticante deve ter um total controle sobre o corpo, mantê-lo estável e sem desconforto. Somente se alcança uma postura confortável após muitos anos de prática, com constância e devoção. Através da prática de asana o praticante aos poucos atinge os outros membros do Yoga, como os Yamas e Niyamas.
Devido ao fato do corpo ser o nosso maior instrumento que podemos trabalhar diariamente, mudando sua estrutura, postura (física e também diante da vida) e padrões (samskaras), sutilmente também vamos alcançando/acessando novos níveis de consciência, quando pode ser atingido um estado meditativo. A união do esforço, concentração e equilíbrio no asana nos força a viver intensamente o momento presente, fato difícil nos dias de hoje.
O corpo é o templo da alma, então este deve se manter saudável, limpo e puro através da prática de asana, que é a ponte que une corpo e mente, e mente com a alma. Quando ocorre essa união, não há mais dualidades.

- Pranayama é o controle do alento vital; a regulação da respiração. Patañjali afirma que o quarto passo só deve ser praticado quando atingida a perfeição no asana.
Prana = força
Ayama = ascensão, expansão, extensão
Pranayama é a expansão da força vital através do controle da respiração. É constituído de três formas: inspiração, expiração e retenção, que são reguladas através da capacidade pulmonar de cada praticante.
Pranayama é um instrumento para manter a mente estável e encaminhá-la para o caminho da concentração.

- Pratyahara significa controle dos sentidos. Com a prática dos quatro membros anteriores (Yama, Niyama, Asana e Pranayama) a mente se torna apta para a meditação. Então, pratyahara é o resultado, a conseqüência dessa prática, que prepara o praticante para os próximos três passos. Em pratyahara os sentidos estão voltados para dentro, é o controle dos órgãos dos sentidos e da mente.

- Dharana – concentração da mente em um só ponto; foco; atenção.
A prática de dharana consiste em manter a mente atenta, em um estado inabalável de atenção em um só ponto. No Yoga Sutra são descritos vários métodos de concentração, que podem ser feitos pelo praticante preparado, como por exemplo, manter o foco somente na respiração.

- Dhyana significa meditação; estabilidade na concentração (dharana). Após o praticante alcançar dharana, manter a concentração, com estabilidade atinge-se dhyana, um estado permanente de meditação.

- Samadhi - estado constante de contemplação, atingido através da prática dos demais membros do Yoga. União entre sujeito e objeto de meditação.

A prática contínua destes três últimos passos (Dharana, Dhyana e Samadhi) sobre um só objeto é chamada de Samyama.

Texto: Rosangela Castellari

Bibliografia:
Yoga Mala - Sri K. Pattabhi Jois - North Point Press, 2002
Light on the Yoga Sutras of Patañjali - BKS Iyengar - HarperCollins Publishers India, 1993
Patanjali Yoga Sutras - Swami Prabhavananda - Sri Ramakrishna Math, Mylapore
Os Sutras do Yoga de Patanjali - Sri Swami Satchidananda - Gráfica e Editora Del Rey Ltda, 2000
O Yama e Niyama do Yoga Sutra de Patañjali - Matthew Vollmer
The Shambhala Encyclopedia of Yoga - Georg Feurstein – Shambhala Publications, Inc., 1997

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